Monday, June 16, 2008

A ideia era ir ver os Vampire Weekend

Sábado à tarde, dia de calor, concerto à borla dos Vampire Weekend no Central Park? É claro que era de ir. A fila, como seria de esperar, começava à porta do Summer Stage, na 72nd Street, e ziguezaveava por entre árvores pelos menos uns dez ou quinze quarteirões. Para aí um quilómetro e meio à vontade de hipsters alinhados à espera de entrar no concerto, ou melhor, de wannabee hispters, já que quem é verdadeiramente hip não se mistura com as massas daquela maneira; quem é verdadeiramente hip não vai a espectáculos gratuitos, mas sim a eventos alternativos ultra-secretos divulgados por canais de comunicação a que só os hipsters têm acesso; quem é verdadeiramente hip já não gosta dos Vampire Weekend porque eles já são demasiado mainstream; quem é verdadeiramente hip viu um um concerto dos Vampire Weekend há um ano atrás «num pequeno bar em Brooklyn» quando ainda ninguém os conhecia.

Seja como for, e fossem elas quem fossem, a verdade é que estavam ali milhares de pessoas para entrar no concerto, circunstância justificada pelo facto de estar em questão aquela que é, de longe, a banda sensação de 2008. E não quero com isto dizer que ache eles sejam extraordinários. Gosto deles, admito que sim, mas neste particular, o pseudo-entendido que estava a atrás de nós a desbobinar ideias feitas sobre música decalcadas da última edição da Rolling Stone e que pertence àquele grupo de pessoas que dizem que o seu álbum preferido dos Radiohead é o Kid A, tinha razão: é curioso como estes fenómenos são criados. Basta um crítico qualquer a quem os amantes de música dão ouvidos dizer «este ano, estes gajos é que são bons» e pronto: está lançado o fenónemo. De um dia para o outro começam a vender discos como se fossem pães quentes, começam a dar entrevistas e aparecem em tudo o que é sítio, até que - e este é o sinal definitivo de que estão mesmo a ter sucesso - os hipsters que gostavam deles antes, decidem deixar de gostar porque já não é cool, e, ao invés, preferem comprar um dos cinquenta CD's exclusivos que a nova banda que ninguém conhece gravou numa cave no SoHo com um daqueles órgãos Casio que encontraram no lixo em sinal de protesto contra a opressão e isso.

Bom, estava eu aqui a querer contar como foi o concerto e, ao olhar para cima, reparo que tenho dois parágrafos recheado de dissertações sobre o funcionamento da cultura indie e, por enquanto, acção... nada. Voltando então à tarde de sábado, estava um belo dia, lembram-se disso? Boa, porque esse dado é importante para se perceber a dimensão pré-apocalíptica da mudança climatérica que viria a verificar-se. Eu já vi muito dia de sol a transformar-se em aguaceiro, mas nada como aquilo. Por acaso, até começou suavemente, como que em jeito de aviso. Uns pingos aqui, outros ali, nada de mais. Depois... a monção. Não estávamos na Índia, bem sei, mas não tenho outra palavra para descrever a quantidade de água que começou a cair. Foi quase como se alguém decidisse construir uma Barragem do Alqueva por cima do Central Park e abrir as comportas naquele momento, tudo isto acompanhado por uma trovoada medonha que parecia estar a rebentar a poucos metros de distância.

Em menos de meio minuto estávamos a pingar como se tivéssemos mergulhado com roupa e tudo no lago ali ao lado. «São burros! Porque é que não se foram embora?», exclamam e perguntam vocês. Não porque fizéssemos assim tanta questão em ver os Vampire Weekend. Isso é garantido. A questão é que ficámos tão encharcados em tão pouco tempo que, agora, nos parecia estúpido irmo-nos embora. Mais estúpido do que ficar, quero eu dizer. Por isso, aguentámos heroicamente até os milhares de resistentes começarem a dispersar e a palavra começar a viajar à velocidade de luz desde desde o início até ao final da fila por entre ahs e ohs de frustração e descontentamento: «Fecharam os portões! Não cabe mais ninguém!».

No metro para casa, a tremer de frio por causa do ar condicionado a congelar-me a T-shirt e os calções colados ao corpo, não estava triste nem frustrado, mas passou-me pela cabeça que se um raio acertasse em cheio do palco e electrocutasse uns quantos, assim uma coisa ligeira, nada de mortes, nem nada disso, eu até ia achar engraçado.

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