Saturday, November 24, 2007

Notas e lições do meu primeiro Thanksgiving

Em Portugal temos imensas feiras gastronómicas, festivais do marisco, recordes que vão desde a maior feijoada até ao maior churrasco do mundo e feriados em que se come até mais não poder, mas o que não temos é um feriado dedicado exclusivamente a comida. E é isso que é o Thanksgiving: uma enorme refeição que começa à uma da tarde e acaba às nove ou às dez da noite. No meu caso, e porque os pais da Jennifer estão separados, duas refeições: uma em casa do pai, outra em casa da mãe, espaçadas por um período de aproximadamente quarenta e cinco minutos.

Na sua essência, o Thanksgiving é a recriação do jantar que os colonos decidiram fazer para agradecer o primeiro bom ano de colheitas desde que se tinham estabelecido na América, sucesso agrícola esse conseguido devido aos ensinamentos dos índios nativos que, por essa razão, foram também convidados para o jantar. Foi, sem dúvida, o ponto alto das relações entre colonos e índios já que, feita a digestão, os índios foram chacinados num espaço de poucos anos. Pode parecer ingratidão, isto de chacinar pessoas depois de nos terem ensinado a sobreviver numa terra desconhecida, mas, quer dizer, povo que nunca chacinou outro que atire a primeira pedra. Nós, portugueses, em termos de chacina devemos estar nos primeiros lugares da tabela, em parceria com os espachóis, imagino, até porque, por alturas do jantar original de Thanksgiving, em 1621, já nós tínhamos anos e anos de experiência chacinatória, desenvolvida à custa de muito povo degolado pelos quatro cantos do mundo.

Bom, mas dizia eu que o Thanksgiving é a recriação desse primeiro jantar, com a diferença de que, à partida, ninguém vai chacinar ninguém nos próximos tempos, até porque isto de mutilar pessoas dá trabalho e implica dispêndio de energia - tarefa para a qual ninguém se voluntaria depois de uma barrigada de perú com recheio, puré de batata, tarte de batata doce, caçarola de feijão verde, coleslaw e souflé de milho, tudo isto cimentado por uma sobremesa de tarte de abóbora, tarte de maçã e cheesecakes de côco e chocolate.

Este foi o meu primeiro Thanksgiving e, como sempre acontece numa primeira vez, há lições a tirar. Destacaria esta: não encher o prato pela segunda vez, principalmente se, dali a três quartos de hora, temos de ir jantar outra vez a casa de outra pessoa. É que, aparentemente, regurgitar perú não é uma das tradições do Thanksgiving*. Estes americanos não sabem o que é diversão, pá.

*Não aconteceu comigo, mas foi por pouco.

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